O olhar crítico

John Dewey dizia que, se um grupo de alunos trocassem ideias, se dialogavam, nesta situação se exaltava a verdadeira Educação. Desta forma, como amante da Educação, resolvi expor meus trabalhos acadêmicos, bem como outros textos, afim de contruir uma realidade mais crítica para a progressividade educacional.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

EDUCAÇÃO E CULTURA

A educação tem, a princípio, como finalidade, promover mudanças desejáveis e relativamente permanentes nos indivíduos, e que estas venham a favorecer o desenvolvimento integral do homem e da sociedade. Portanto, é importante ressaltar que a educação atinja a vida das pessoas e do conjunto em todos os âmbitos, visando à expansão dos horizontes pessoais, o desenvolvimento humano, além da observação das dimensões econômicas e o fortalecimento de uma visão mais participativa, crítica e reflexiva dos grupos nas decisões dos assuntos que lhes dizem respeito.

“Não há ninguém que, tendo sido abandonado durante a juventude, seja capaz de reconhecer na sua idade madura em que aspecto foi descuidado, se na disciplina, ou na cultura (pois que assim pode ser chamada a instrução). Quem não tem cultura de nenhuma espécie é um bruto; quem não tem disciplina ou educação é um selvagem. A falta de disciplina é um mal pior do que a falta de cultura, pois essa pode ser remediada mais tarde, ao passo que não se pode abolir o estado selvagem e corrigir um defeito de disciplina”. (NETO, 2003 apud KANT, 1996, p.16).

A educação é um acontecimento pessoal. É pela educação que a cultura e a humanidade são transmitidas, conservadas e transformadas. Educação tem tudo a ver com devir humano. A escola se faz em um espaço de participação, de compartilhamento, de disputa e de negociação de sentidos que implicam em transformações na vida pessoal de cada um dos que a freqüentam e na vida social de todos. A escola é um espaço em que produzimos, transmitimos e criamos cultura.

No Brasil, o debate sobre as relações entre cultura popular e escola pública surge entre as décadas de 50 e 60, a partir do método Paulo Freire e de outros movimentos de educação popular, aparecendo o que se denominou educação popular. Educação esta que valoriza, sobretudo a cultura popular e que estaria, inicialmente, destinada ao povo, aos oprimidos, referindo-se nesta perspectiva à valorização desta cultura como meio de lutar contra a discriminação dos seus produtores e reforçar os grupos sociais que tem sua participação restrita na sociedade pela classe dominante, ou elite, cuja cultura seria, teoricamente, a erudita.

Infelizmente, o que observamos da realidade educacional, social e cultural do nosso Brasil, é que este não favorece o desenvolvimento do verdadeiro potencial do nosso povo, pois este vive, ou melhor, sobrevive aos favores das vontades dos poderosos. As escolas públicas que abrigam os alunos oriundos das camadas populares são vítimas de programas governamentais que nunca priorizam suas necessidades e nem oferecem condições reais para o melhoramento e avanço da educação brasileira, posto que não há como progredir sob o domínio de um Estado cujas medidas se mostram contrárias aos interesses populares, devido ao seu comprometimento com a classe dominante.

A educação tem também de enfrentar outros tipos de obstáculos que impedem o seu progresso tais como a necessidade de a criança trabalhar para complementar a renda familiar, a violência urbana que afasta os pobres da escola além das greves dos professores, que embora justas, prejudicam o bom andamento escolar.

Como a cultura, a educação sofre influências cada vez maiores do fator socioeconômico e do político, e é devido a esta conjuntura participativa que cresce o papel da educação em relação ao desenvolvimento como compromisso social. O desenvolvimento e a educação não podem ser vistos como idéias separadas, mas como um único conceito que se desdobra em uma cadeia de ações que se complementam. Assim o ensino deixa de ser exclusivamente da escola e o desenvolvimento se torna o maior meio de educação como prática social.

“Vivemos em uma sociedade de classes onde as desigualdades sociais, econômicas e políticas ultrapassam os limites da imaginação. Essas desigualdades são responsáveis pela situação de “apartação” reinante, na qual, muitas vezes, “rico” e “pobre” só se encontram em situações de faxina ou assalto. Por um lado condomínios de luxo, rodeados de grades de ferro, por outro, favelas que se estendem até os quatro horizontes, levando a justaposição, na mesma sociedade, de modos de vida radicalmente diferentes um do outro. É responsabilidade de todo cidadão zelar pela erradicação desta desigualdade, resultado de estruturas políticas e econômicas perversas”. (FONSECA, 2009, p. 03)

A reflexão sobre o papel da educação em uma sociedade cada vez mais de caráter multicultural, é recente e crescente no nível internacional e, de modo particular, na América Latina. No entanto, a gênese desta preocupação obedece a origens e motivações diferentes (sociais, políticas, ideológicas e culturais) em diversos contextos, como o europeu, o norte-americano e o latino-americano. De qualquer modo, é a própria concepção da escola, suas funções e relações com a sociedade, o conhecimento e a construção de identidades pessoais, sociais e culturais que está em questão.

Vivemos uma época em que a consciência de que o mundo passa por transformações profundas é cada dia mais forte. Esta realidade provoca em muitas pessoas e grupos, sentimentos, sensações e desejos contraditórios, ao mesmo tempo de insegurança e medo, potenciadores de apatia e conformismo como também de novidade e esperança, mobilizadores das melhores energias e criatividade para a construção de um mundo diferente, mais humano e solidário.

Globalização, multiculturalismo, pós-modernidade, questões de gênero e de raça, novas formas de comunicação, informatização, manifestações culturais dos adolescentes e jovens, expressões de diferentes classes sociais, movimentos culturais e religiosos, diversas formas de violência e exclusão social configuram novos e diferenciados cenários sociais, políticos e culturais.

A escola não pode ignorar esta realidade. O impacto destes processos no cotidiano escolar é cada vez maior. A problemática atual das nossas escolas de primeiro e segundo graus, particularmente as das grandes cidades, onde se multiplicam uma série de tensões e conflitos, não pode ser reduzida aos aspectos relativos à estruturação interna da cultura escolar e esta necessita ser repensada para incorporar na sua própria estruturação estas questões e novas realidades sociais e culturais.

No interior da cultura, recebemos, aprendemos, reproduzimos, transmitimos, transformamos e criamos o mundo e a humanidade por meio das práticas socioculturais. Podemos dizer que nos educamos e somos educados nessas práticas. Passamos a participar de um mundo humano.

Assim, a educação acontece em todos os lugares em que as pessoas estão se relacionando umas com as outras: na família, no trabalho, no templo, no quintal, no mato, etc. Em qualquer ambiente desses, alguém educa alguém com ou sem intenção de educar.

O processo pelo qual entramos em uma cultura e aprendemos a ser e a viver é denominado endoculturação. A endoculturação é diferente da aculturação, em que a cultura de um povo é negada pela cultura de outro povo.

A educação como endoculturação é forma que possibilita a convivência social em que compartilhamos, disputamos e negociamos o mínimo de valores, crenças, saberes, normas e símbolos. É, ao mesmo tempo, um acontecimento pessoal (educo-me com os outros) e social (sou educado pelos outros). E é, sobretudo, o modo como o humano se faz presente no próprio humano.

“Talvez a educação se torne sempre melhor e cada uma das gerações futuras dê um passo a mais na direção ao aperfeiçoamento da Humanidade, uma vez que o grande segredo da perfeição da natureza humana se esconde no próprio problema da educação. A partir de agora, isto pode acontecer. [...] Isto abre a perspectiva para uma futura felicidade da espécie humana”. (idem, p. 16-17)

Desde que nascemos vamos aprendendo a viver numa cultura que as gerações anteriores criaram. Essa transmissão cultural é a presença do humano no humano: a educação num sentido bem amplo, pela qual homens e mulheres se fazem humanos e educadores na vida.

Acontece que no movimento de transformação da cultura (criação de novos significados, de novos modos de trabalhar e de novas regras de convivência) a vida social transforma-se, a ponto de as pessoas precisarem se apropriar de saberes específicos para poderem participar das práticas sociais. Isso implica numa divisão do saber e do trabalho e na necessidade de novos saberes que possam dar conta de controlar a própria vida social.

Muito embora essa divisão signifique bem uma situação de desigualdade social, ela está presente na cultura e a escola tem a ver com ela. A escola foi criada como instituição educativa, isto é, para transmitir às novas gerações aqueles elementos culturais (saberes específicos) necessários para a participação na vida social, conforme a divisão do trabalho, do poder e do saber. “Na escola, vivemos nosso mundo, o mundo dos outros e compartilhamos, pensamos, imaginamos, planejamos, projetamos, criamos outros mundos juntos”. (BESSA, 2005). Uns aprendem e fazem certas coisas, outros aprendem e fazem outras coisas.

A necessidade de ensinar e de aprender saberes específicos para poder participar da vida social fez que a escola fosse inventada como lugar em que se cuida e se ensina às crianças coisas que não se aprende em casa nem na rua (saberes científicos e técnicos) e lugar em que se aprende (muitas vezes sem saber) de maneira diferente as coisas que se aprende em casa e na rua também (o “jeitão” humano de viver).

“Com isso, podemos pensar que homens e mulheres se tor­nam humanos quando podem experimentar em suas vidas a possibilidade de falar e de escutar os outros, de expressar-se e perceber os outros, de sentir-se e de sentir os outros in­tegralmente: como seres simbólicos, produtivos, sensíveis, morais e políticos. Podemos pensar, também, que o homens e mulheres vêm a ser o que são pela educação de que partici­pam com outros homens e mulheres”. (BESSA, 2005, p. 77)

A escola, mesmo sendo uma instituição criada especificamente para ensinar aquele mínimo de cultura necessária à convivência das diferenças é, como qualquer outra instituição social, um espaço em que produzimos, transmitimos e criamos cultura. Logo, é também um espaço educativo em sentido amplo: tem a extraordinária tarefa social de criar intencionalmente as condições educativas para que possamos receber, desconstruir e reconstruir o mundo humano já construído.

A escola, em sua tarefa social, educa tanto para a obediência aos costumes (padrões de comportamento) da comunidade e da sociedade como pode educar para um posicionamento crítico e autônomo em relação a esses padrões.

Para tanto, é preciso integrar a cultura à questão educacional, porque a educação é resultado das práticas culturais dos grupos sociais. O próprio processo de ensinar e aprender revela essas práticas. Sabemos que todos os seres humanos têm cultura, e que a cultura não é inata nas pessoas, mas é adquirida na convivência em grupo. E o lugar ideal para a aquisição, desenvolvimento e conscientização da importância da cultura, ainda é a escola. Nela alunos e professores trocam experiências, vivências e singularidades. Convivem diariamente com as diferenças e praticam a “inclusão cultural”.

A reflexão sobre educação não se esgota jamais. O processo educativo, seja o formal transmitido pela escola, seja o obtido através da experiência de vida não é temporário e se presta a insistentes debates e intenso estudo.

A pedagogia, como bem nos aponta o verbete do dicionário, trabalha com uma série de técnicas, fundamentações teóricas, experiência, conhecimento elaborado, com ideais educativos que passam a ser ideais de vida; portanto, a pedagogia pode-se dizer, mobiliza o indivíduo por inteiro. O papel da escola, no mundo da educação, é o de questionar criticamente os modos de pensar, de sentir, de atuar e os resultados dessa atuação das gerações humanas. Em síntese, o papel da escola perante as demandas contemporâneas seria o de recriar a cultura na escola e a cultura que nos rodeia.

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